Pai Poeta e o Sono
Mensagem da Brigada anti-tabagismo
PAI POETA E O SONO
A INSÔNIA E OS CARNEIRINHOS
Insônia. Insólita bandida. Mercadora de noites imponderáveis. Contar os carneirinhos pulando a cerca de madeira velha da fazenda...Um remédio mental para quem não quer afundar no Titanic dos Benzodiazepínicos e seus colegas farmacológicos. Contar carneirinhos pra mim não funcionava. Na minha viagem a Pequim, e na volta do passeio à grande Muralha da China a nossa guia nos levou a um enorme restaurante de beira de estrada. Não sei como, mas, me lembro de que após a degustação da sopa de osso de pato (entrada), uma conversa em espanhol com nossa guia chinesa entrou pelo assunto sono, insônia e etc. ela levou-me a uma mesa no fundo do restaurante e chamou um velho senhor chinês que aparentemente ajudava no funcionamento do restaurante e que também falava espanhol. Falamos de sono e ele sabia que este era um “tendão de Aquiles” da medicina ocidental. Falou do possível uso de ervas chinesas que eu prontamente recusei. Perguntei sobre métodos mentais, usando nossa própria força mental. Lembrei a ele o nosso hábito de contar carneirinhos. Ele sorriu e me disse esfregando os tradicionais bigodes. “Contar carneirinhos não. Contar não, eles não gostam, lembra matadouro. Eles gostam é de aprender. Você verá os olhos daqueles bichinhos brilhando. Eles almejam sempre aprender, mas, mas cuidado eles são espertos e fazem muitas perguntas. Se se empolgam com a sua aula eles lhe darão um belo sono”. Ouvi tudo com muita atenção e na minha mente guardei todos os detalhes. Dar aula para os carneirinhos. Bom, não vou entrar em detalhes, mas vou contar minha primeira noite no hotel em Pequim.
- Fechei os olhos como ele me havia ensinado e me deparei com uma turma de quarenta carneirinhos todos iguais, brancos com focinho preto e patinhas pretas sentados em velhas cadeiras escolares de madeira marrom claro e eu estava à frente deles, umas 4 fileiras de 10 carneirinhos que me olhavam com olhares brilhantes, alguns com as patinhas pretas segurando o queixo ou um graveto que parecia ser um lápis, outros com a patinha traseira cruzada sobre a coxa, alguns com sorrisos amistosos e eu com giz na mão. Lembro-me até da sensação da poeira do giz na mão direita, uma lousa verde, retangular imensa que se perdia além da parede da sala que parecia feita de nuvens. Então eu comecei a aula, a ensinar carneirinhos. Falei do surgimento do mundo do “Big – Bang” e desenhei na lousa um ponto pequeno, quase um átomo uma luz avermelhada, uma explosão e uma miríade de planetas, tudo! Tudo engendrado há 9 bilhões de anos.
O da primeira fileira à direita levantou a patinha: “Mas mestre, como um ponto de giz, vira tido isto? Nossas montanhas, nossos rios, não professor, o senhor está blefando”. Blefando... Blefando...
Lembro ainda hoje como pensei: “Eles ainda falam”. Blefando... Blefando...
Era como o badalar de um sino dominical. Eu ia começar a falar da relação homem-mulher da união estável casamento (pois casamento é oitocentista, não é?), ou melhor, de carneirinho – carneirinha, mas, blefando... Blefando... Um badalar resoluto e decrescente. Sonolento, sonolento... Blefando... Blefando...
Acordei com o sorriso de alguém em cima de mim e o rosto bem animado. Quem? Não posso dizer!
Grande filósofo chinês. Ensinar carneirinhos... Já estou preparando minha próxima aula!